terça-feira, 30 de abril de 2013

ABORDA envia carta ao ministro Padilha reclamando do ´esquecimento´ da pasta com a redução de danos




A ABORDA enviou correspondência ao ministro da Saúde, Alexandre Padilha, manifestando sua preocupação com o crescimento de políticas conservadoras e fundamentalistas na área do combate às drogas e com o “esquecimento” gradativo que o assunto tem tido diante da realidade brasileira. 

“Apesar dos índices de usuários de drogas com HIV ser elevado - estudos realizados em dez municípios brasileiros, entre 2008 e 2009, estimaram taxas de prevalência de HIV de 5,9% entre usuários de drogas - a última campanha para esta população foi em 1999”, afirma Domiciano Siqueira, presidente da ABORDA. 

Os ativistas da instituição comentam que a estratégia de redução de danos de álcool e outras drogas mostrou no Brasil, e em outros países, importante contribuição para o controle das Hepatites Virais e da Aids. Desde as primeiras experiências na década de 1980, com ações para a troca de seringa para usuários de drogas injetáveis, houve uma sensível queda nos casos notificados desta população. 

Na carta, o presidente afirma que “um exemplo recente (do “esquecimento”) é a diminuição do apoio do Ministério da Saúde, através do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais, na interlocução com a sociedade civil atuante neste campo”. E completa: “O número de usuários de drogas portadores destas patologias é crescente sem que qualquer ação de prevenção direcionada, ou de assistência humanizada integrada, tenha sido promovida nos últimos anos”. 

A organização atua há quinze anos no âmbito da saúde pública dos e direitos humanos, reunindo ativistas de todo o país. Eles afirmam sempre ter cultivado filosofias que vão além do proibicionismo com relação às drogas, e solicitam uma audiência com o ministro para discutir o assunto.



Leia a carta na íntegra abaixo. 

Senhor Ministro,

A Associação Brasileira de Redução de Danos (ABORDA), organização que atua há quinze anos no âmbito da Saúde Pública e Direitos Humanos, vem através desta manifestar sua profunda preocupação com o “esquecimento” gradativo que esta política tem tido diante do enfrentamento da realidade do uso e abuso e álcool e outras drogas no Brasil.

Embora seja uma política pública oficial preconizada na Política de Atenção Integral a Usuários de Álcool e Outras Drogas (2003), e respaldada pela Portaria Nº 1.059/GM de 4 de Julho de 2005 do Ministério da Saúde, que destina incentivo financeiro para o fomento de ações de redução de danos em Centros de Atenção Psicossocial para o Álcool e outras Drogas - CAPSad , o que tem se notado nos últimos tempos é um desmantelamento da concepção original da abordagem e uma gradativa desvalorização da sociedade civil com atuação neste campo.

A opção que tem sido feita pela internação compulsória aos usuários de drogas e a “entrega” de seu cuidado, de forma terceirizada e muitas vezes despreparada, a instituições com inspiração religiosa fere o caráter laico do Estado brasileiro, consagrado na Constituição Federal. Enquanto assistimos atônitos o crescimento de mortes e o inchamento de serviços de saúde por vítimas da repressão, da violência policial e da exclusão da qual o Estado é muitas vezes promotor, notamos também que todos os anos de acúmulo, reflexão e experiência da Política de Redução de Danos não tem sido considerados na formulação de estratégias de saúde e na priorização de ações com apoio público.
Um exemplo recente é a diminuição do apoio do Ministério da Saúde, através do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais na interlocução com a sociedade civil atuante neste campo. O número de usuários de drogas portador destas patologias é crescente, sem que qualquer ação de prevenção direcionada, ou de assistência humanizada integrada, tenha sido promovida nos últimos anos. Além disto, o apoio para que Organizações da Sociedade Civil possam dar continuidade às ações desenvolvidas, muitas vezes de forma precária, tem se encolhido ficando o tema em plano inferior no conjunto de demandas públicas.

Exemplo próximo são os recentes editais de financiamento do Departamento citado que tem contemplado de forma muito rara e tímida, ações e eventos propostos pelas ONGs com atuação em Redução de Danos. A ABORDA não consegue realizar um encontro nacional há quase três anos e tem batido às portas do Ministério da Saúde em busca de apoio para isto, sem receber acenos de possibilidades de parcerias. Enquanto isto a demanda se mantêm crescente principalmente diante dos vínculos formados pelos redutores e redutoras junto aos usuários, o que gera ambiente de confiança e possibilidade de se estudar a formulação de políticas públicas mais efetivas.

Diante do exposto, e do quadro grave que o país atravessa com ameaças conservadoras de toda a ordem e necessidade urgente de se repensar a política de drogas além do proibicionismo - filosofias que a ABORDA sempre cultivou- solicitamos a oportunidade de uma audiência com V. Exc. e o exame da possibilidade de firmarmos parcerias. 

Temos experiência acumulada em campo, produção sistematizada, atuação nacional, credibilidade conquistada em 15 anos de trabalho, vasta participação em conselhos e espaços de Direitos Humanos, articulação e proximidade com as populações vulneráveis. Nos falta apenas a sensibilidade governamental para que a bandeira da Redução de Danos possa atuar em parceria em prol desta população tão necessitada.

No aguardo de um retorno favorável, agradecemos,

Atenciosamente

Domiciano Siqueira
Presidente da ABORDA

0 comentários:

Postar um comentário